LIVRO: A Mulher de Trinta Anos - Honoré de Balzac - Análise Crítica

As moças costumam criar nobre, encantadoras imagens, figuras totalmente ideais, e forjam ideias quiméricas sobre os homens, sobre os sentimentos, sobre o mundo, depois atribuem inocentemente a um caráter as perfeições com que sonharam e a ele se entregam, amam no homem de sua escolha essa criatura imaginária.
(A mulher de trinta anos - Cap I pg 35)

Já nas primeiras páginas da obra A mulher de trinta anos vemos a fala profunda do pai, para a jovem Julie que está criando uma fantasia amorosa pelo coronel, em seguida seu pai lhe faz uma profecia e lhe diz que a ilusão que ela tem pelo coronel irá se dissipar e que ela não terá um casamento feliz.

Podemos imaginar que por mais sábio que fosse o pai o seu aviso não surtiu efeito no jovem coração de nossa heroína, e toda trama do livro se inicia com o casamento de Julie que em poucos dias se faz uma escolha infeliz.

O livro é dividido em seis partes ou capítulos sendo eles, Primeiras Faltas, Sofrimentos DesconhecidosAos trinta anosO dedo de DeusOs dois encontros e A velhice de uma mãe culpada.

A mulher de trinta anos: Primeiras Faltas

Nessa primeira parte do livro vemos o início da vida de casada de Julie, suas infelicidades e uma ênfase no papel da mulher no séc XIX. Este primeiro momento é dedicado aos pensamentos da personagem.

A tia encontrou ali num desses momentos de crise em que a alma está sem força, em que tudo é indiferente, o bem como o mal, o silencio como confiança.
(
A mulher de trinta anos - PG 50 )

Conhecendo a tia de seu marido Julie acredita que vai ter uma companheira alguém que irá ajudá-la a lidar com a vida de um casamento sem amor, porem por uma fatalidade do destino mal elas se conhecem e tia acaba falecendo.

Muitas vezes uma mulher acorda de repente a beira ou no fundo de um abismo.
(
A mulher de trinta anos - PG 67 )

O Sr.d'Aiglemont dormia sereno a seu lado , sem ser acordado pelas lagrimas quentes que sua mulher deixava cair sobre ele.
(
A mulher de trinta anos - PG 75)

Julie acaba sem esperanças de felicidade embora ocorra alguns olhares furtados com um jovem britânico que logo acaba se fazendo presente em sua vida, por um momento nós achamos que estamos acompanhando uma história de um amor arrebatador que culmina em um fim glorioso. Mas nossa heroína como uma típica mulher de seu século quer manter-se horada e honesta e agora como possui uma filha com seu marido Vitor sofre por se apaixonar pelo Lorde e Médico inglês Arthur.

A paixão ganha em profundidade o que parece perder em intensidade.
(
A mulher de trinta anos - PG 79 )

Vemos a Narrativa ganhando cores, subindo como uma montanha russa, nossa expectativa se eleva só para depois despencar com uma tragédia que encerra o primeiro capitulo desse livro intrigante.

A mulher de trinta anos: Sofrimentos Desconhecidos

Essa mulher tinha vinte e seis anos. Nessa idade uma mulher gosta de saborear a morte, quando ela lhe parece benfazeja.
(
A mulher de trinta anos - PG 100)

Na segunda parte do livro vemos um Cura (uma espécie de padre) tentando argumentar com a Marquesa sobre as suas dores enquanto ela tenta lhe mostrar que a razão de seus sofrimentos é o homem, é a própria sociedade que compõe seu mundo. Porém o padre a vê como uma perdida, pra ele a razão do sofrimento dela é a falta de profundidade na religião. Um jogo de pontos de vista é formado, a Marquesa  fala com eloquência desnuda a sociedade e os pilares da construção humana de seu tempo, enquanto o padre tudo ignora enquanto prega uma religião cega, e tenta empurrar guela abaixo de Julie.

- A dor - ele respondeu - só é viável nas almas preparadas pela religião.
A mulher de trinta anos - PG 117)

 Julie mantém-se fiel a ela mesma apesar dos argumentos do Padre, decide que o seu encontro com Deus advir dela mesma do seu interior e não dá religião em si. Ela parte do pressuposto de que não é a religião, que vai salvar a sua alma.

 Os pensamentos de nossa Heroína e o modo como ela se expressa, mostram um pensamento muito avançado para seu tempo, onde as melhores mulheres não deveriam se quer pensar por si mesmas. Porém o Narrador deixa nas entrelinhas que o poder de pensar de Julie veio de seu pai, - sua mãe morreu quando ela era muito jovem- talvez esse pensamento nos leve a uma ideologia paternalista , mas o autor nos argumenta que essa não é essencialmente a razão e sim o fato de que as mulheres são criadas para transmitir sempre os mesmos valores umas paras outras ( Mãe = Filha) sendo que os valores em questão, são de uma sociedade em que o homem da sempre a última palavra, na qual a mulher carrega os deveres e a obediência. Já Julie sendo criada por seu pai quebra esse ciclo, ( Pai = Filha) por ter um pai sábio ela passa a ver mundo de outra forma na segunda parte do livro. Nesse ponto o autor trabalha os fatores de causa e consequência do que era ensinado para as moças da época e forma como o pai de Julie quebra esse ciclo.

Reconhecendo o Eu humano sob suas mil formas , perdeu a esperança de amolecer aquele coração que o mal ressecara em vez de enternecer e no qual o grão do semeador celeste não deveria germinar.
A mulher de trinta anos - pg 117)

 Nessa passagem vemos em Semeador uma referência ao sermão da sexagésima do Padre Antônio Vieira, Esta obra referida é rica em metalinguagem e tem como objetivo ensinar padres a serem padres, colocando-os como Semeadores. O Sermão inteiro é altamente argumentativo, ensinado os padres a conquistar os fiéis (plantar a semente) que é o esse Cura tenta de todo jeito fazer com a Marquesa.

A mulher de trinta anos: Aos trinta anos

Mulheres, ideias, sentimentos, tudo se assemelha. Aqui não existem mais paixões, porque as individualidades desapareceram.
(
A mulher de trinta anos - PG 121 )

O início dessa terceira parte da obra se dá pelo ponto de vista de um novo personagem, o diplomata Charles, que logo se sente atraído pela misteriosa Marquesa que vive reclusa da sociedade, mais ao mesmo é uma parte importante dela. Nesse momento vemos o narrador devanear sobre a importância que é dada a cada pessoa de uma sociedade, umas são pilares outras são topos.

  Logo Charles conquista a atenção da Marquesa e eles iniciam um caso amoroso.

Uma mulher só se debate quando foi agarrada. No dia em que a Marquesa admitiu ser amada, aconteceu-lhe  flutuar entre mil sentimentos contrários.
A mulher de trinta anos - PG 136 )

A mulher de trinta anos: O dedo de Deus

Não conheço nada mais terrível que um pensamento de velho numa fronte de criança.
(
A mulher de trinta anos - PG 146 )

Este é o momento que o romance desanda ladeira abaixo, o leitor se perde por alguns momentos refletindo se é isso mesmo que está acontecendo na obra, podemos ver até uma mudança no tom do autor, nossa heroína não é mais referida por ele, pelo nome Julie e sim por Marquesa, um título mostrando uma certa frieza e distanciamento, as cenas são descritas por um personagem que não se apresenta, ele é apenas um passante observando o passeio de quatro pessoas, um homem e uma mulher adultos, e duas crianças um menino e uma menina. Fica claro para o leitor que a mulher é nossa Marquesa, mãe das duas crianças, porém a preferência dessa mãe é legada infinitamente mais ao menino mais novo, há uma sombra na cena que o expectador observa e logo uma tragédia abala mais uma vez nossa heroína.

 Desta vez porém o sofrimento de Julie não tem foco. O narrador simplesmente pula alguns anos e vamos para o próximo capitulo.

A mulher de trinta anos: Os dois encontros

Tenho o que todas as mulheres desejam! Sentir um amor , uma devoção imensa por quem se ama, e encontrar em seu coração, no dele um sentimento infinito em que a alma de uma mulher se perde e sempre ! Diga , isso é felicidade? Devorei mil existências .
(
A mulher de trinta anos - PG 201)

Já a algum tempo o narrador vem dando pistas do sofrimento de Hélene filha da Marquesa, depois de tudo que sua mãe a fez passar, coisas que não é eram nem sua culpa, o narrador da voz aos sentimentos da jovem. Neste momento nossa antiga Julie já não tem lugar em nossa empatia, os olhares se viram para sua filha Hélene.

Um visitante inesperado forma o primeiro encontro, e a vida de Hélene muda radicalmente, e ela pode finalmente se desprender das correntes de angustia, que vem cercando sua vida desde de muito cedo. O segundo encontro é composto por uma nova Hélene e seu pai seis anos após o primeiro.


A mulher de trinta anos: A velhice de uma mãe culpada.

Esse sorriso provava a jovem parricida que o coração de mãe é um abismo no fundo do qual sempre se encontra perdão.
(A mulher de trinta anos - PG 227)


Chegamos ao fim da trama onde o leitor já acredita não haver mais surpresas, nossa heroína foi se desgastando no decorrer da obra e agora nesse momento o leitor já não sabe qual sua opinião sobre ela. Então mais uma surpresa pesa no coração de nós expectadores, um novo clímax para anunciar o fim da obra.

A mulher de trinta anos: Minha opinião

Este livro me fez sentir uma torrente de emoções, é como se fossem várias histórias em uma só, fiquei muito confusa em alguns momentos, perdida até que me lembrei que se trata de uma história de vida.  A mulher de trinta anos traz a história da vida de Julie, uma mulher que só queria encontrar a felicidade e acabou se perdendo no meio do caminho, é um retrato da sociedade do século XIX, e nos faz pensar que apesar do tempo as pessoas não mudaram tanto assim, quantas vezes deixamos nossa própria felicidade a mercê de outra pessoa? Este é um livro que nos faz refletir o que podemos fazer para sermos quem nós somos, sermos fieis a nós mesmos e ainda sim fazer parte de um todo de uma união, perder o nosso egoísmo tão natural e enraizado e alcançar a evolução, que cada um carrega dentro de si.
                                                                      

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